quarta-feira, 4 de maio de 2016

LUA DE MEL NO RIO DE JANEIRO



            Meus pais idealizaram passar uma “romântica” lua de mel no Rio de Janeiro. Uma parte da minha família paterna mora por lá, então ficou decidido que eles não teriam despesas com hotel. Carmem, uma prima nossa, fez a seguinte proposta para meu pai:
            -Fred, vocês poderiam ficar naquele meu apartamento que está desocupado.
          Esse apartamento tem uma história que não pode passar em branco. Minha prima morava nele e certa noite seus filhos quando se preparavam para dormir, observaram uma pequena faísca que saía da instalação da lâmpada do quarto. Em fração de segundos, o apartamento pegou fogo. Os bombeiros chegaram imediatamente ao local, mas não conseguiram controlar as chamas. Foi tudo muito rápido. Esse incêndio ficou famoso na época, foi noticiado em rádios e jornais, porque em meio a essa destruição, quase tudo no apartamento havia sido queimado, menos a Bíblia.
            Depois do incêndio, nossa prima foi morar em outro apartamento e refez sua vida por lá. O apartamento incendiado foi lavado, porém precisava passar por uma pintura, suas paredes eram puro carvão. Mas foi justamente para lá que meus pais foram passar a tão sonhada lua de mel: nesse “apartamento assustador”.
            Carmem disse o seguinte:
-Já que vieram passar a lua de mel aqui no Rio, nada mais justo que comemoremos com uma festa de casamento aqui também.
Ela resolveu improvisar esta festa para eles. Carmem era viúva de um alpinista e ainda tinha guardado o seu vestido de noiva. Mandou para a lavanderia e o mesmo voltou novo! Mas tinha um detalhe que não passava despercebido por ninguém: o vestido era roxo! Como era de se imaginar, o sapato, idem. O vestido serviu perfeitamente em minha mãe, mas o sapato, não. Então ela teve que usar o próprio sapato que era vermelho. Veja que "combinação": vestido de noiva roxo com salto alto vermelho. A roupa que o alpinista usou no casamento (que também era roxa, obviamente), não serviu no meu pai. Mas como essa festa tinha que sair, ele usou sua camisa amarela com bolinhas pretas e calça jeans.
E o fotógrafo? Tinha que ter um para registrar todo esse “desfile de moda”, não é mesmo? Segundo Carmem, isso era o mínimo, ela organizou tudo! Chamou um amigo que chegou ao evento com uma máquina extremamente potente de fotografar amebas (ele era fotógrafo de laboratórios)! Doces e salgados foram encomendados e após a festa, o casal 20 passeava naturalmente pelos principais pontos turísticos do Rio de Janeiro, ainda com os trajes do casamento. Foram a sensação do Rio naquela noite, acredito que chamaram mais atenção que Elke Maravilha e o cantor Falcão juntos. As pessoas na rua não somente olhavam, como pediam para tirarem fotos com meus pais. E o pior é que eles aceitavam (ainda bem que naquela época não haviam inventado o Facebook).
Depois da comemoração, foram para o apartamento para enfim desfrutarem a “lua de mel incendiada”.
No outro dia, Carmem muito receptiva, convidou meus pais para conhecerem a famosa “Casa do Samba”. Eles aceitaram. A Casa do Samba era como uma boate de luxo e tinham alguns shows, algo muito chique mesmo. Ao chegarem lá, Carmem tentou advertir  minha mãe:
-Keyla, é melhor você ficar com Fred ali no canto da parede, porque quando as sambistas começarem seus shows, elas praticamente atacam os homens e os puxam para dançar de uma maneira que eles não conseguem se esquivar.
Minha mãe achou que aquilo fosse uma “piadinha” de Carmem e deixou meu pai lá todo soltinho...
Um “detalhe” interessante, foi que meus pais estavam justamente sentados próximos à escada que as mulatas desceriam sambando. Com pouco tempo, a batucada começou e as dançarinas começaram a descer a escada completamente nuas! A única coisa que cobriam seus corpos eram uns brilhinhos, algo muito parecido com a caracterização da famosa “Globeleza”. Segundo minha mãe, era cada mulherão...
Meu pai, coitado, tentava disfarçar os olhares, mas ele estava bem no alvo das dançarinas. Sentado estava, sentado permaneceu. Não demorou para uma bela mulata vir se esfregar nele. Com o perdão da palavra, ela sambava requebrando a bunda nos ombros dele, e naquele momento, acredito que ele sentiu na pele o que sente um bipolar: estava feliz com o show de samba da mulata visto tão de perto e ao mesmo tempo triste com os beliscões que minha mãe dava nele. A mulata o chamou para dançar, ele ficou naquela indecisão...
Tudo indica que os beliscões foram mais fortes que a vontade de aceitar o convite da mulata, porque da cadeira ele não se levantou. Com a recusa de meu pai, a mulata com muita naturalidade, sentou-se no colo dele e continuou dançando. Imagino a cara de “satisfação” da minha mãe e a “bipolaridade” do meu pai. Os beliscões intensificaram-se.
Quando uma mulata se engraçava de algum homem, o fotógrafo da Casa do Samba, automaticamente disparava incontáveis flashes e em pouquíssimo tempo já estavam com as fotos prontinhas para venderem ao cliente (nesse caso, meu pai). Minha mãe, nada satisfeita, perguntou:
-Fred, você vai comprar isso?
Com um sorriso pra lá de amarelo, ele argumentava:
-É, né...?! O fotógrafo vive disso, não é mesmo, Keyla? Não posso fazer essa desfeita com o coitado...
Comprou! Ainda não sei como ele teve tamanha coragem, porque nessa época ele já conhecia bem a minha mãe. Quando eles voltaram para o apartamento incendiado, minha mãe, bastante enfurecida e cheia de argumentos bombásticos,“botou fogo” no apartamento pela segunda vez! Ele falava:
-Não acredito que você está com raiva só por causa dessa besteirinha!
-Besteirinha? Você ficou zarolho olhando para a bunda da sambista, achou pouco, comprou a foto e ainda trouxe pra casa! Faz uma desfeita desse tamanho na nossa lua de mel e ainda vem me dizer que tudo isso é uma besteirinha?
-Tá bom! Eu vou rasgar essa foto para acabar com esta confusão!
Mas ele foi muito cauteloso no exercício dessa tarefa: rasgou de uma maneira bem demorada. Depois que a foto estava toda picotada, ele pegou todo aquele monte de pedacinhos e mostrou à minha mãe justificando-se:
-Pronto Keyla, rasguei a foto! Agora você não tem mais razão para discutir comigo.
Tudo ficaria bem se não fosse por um detalhe...
Quando minha mãe pegou a foto toda picotada, de imediato percebeu que a bunda da sambista estava intacta! Sem nenhum recorte, essa imagem ele preservou.

Minha mãe botou fogo no apartamento pela terceira vez e adeus lua de mel!  

Nenhum comentário:

Postar um comentário