quarta-feira, 15 de junho de 2016

A EXCEÇÃO DA REGRA



         Eu passava por um momento financeiro e emocional bem difícil. Resolvi mudar de casa, achei que esta atitude iria me fazer bem, precisava de uma mudança também de ares. Quando o caminhão da mudança foi embora, eu estava completamente perdida naquela bagunça interna e externa. Sabendo que eu estava passando por este processo, uma grande amiga, chamada Regina, me ligou:
-Se te conheço bem, sou capaz de apostar que você está quase louca com tanta desordem, não teve como preparar seu almoço e nesse exato momento está com um pacote de biscoito e uma latinha de refrigerante, julgando que isso será sua refeição, correto?
-Tenho que admitir que você ganhou essa aposta.
-Estou largando do trabalho agora, vem andando. Você vai almoçar comigo.
-Graças te dou!
Entre as nossas casas, ficava o trabalho dela. Cheguei lá e fiquei no portão esperando, quando ela vinha ao meu encontro, um homem a fez recuar. Ele conversava com ela e olhava para mim, por repetidas vezes. Quando finalmente Regina conseguiu livrar-se do homem, ela estava com um sorriso estampado no rosto. Desconfiei...
Começou a argumentar:
-Você não sabe...
-Sei sim. Aquele homem mandou algum recado para mim.
-Nunca vi uma criatura com o sexto sentido tão aguçado como você! Parece que lê os pensamentos das pessoas, às vezes tenho medo de você sabia?!
-Ahhhhh, pra cima de mim, Regina? Eu não leio pensamentos, leio olhares. Eu sei o que ele quer.
-Sabe quem é ele?
-Não, mas deve ser algum grandalhão daí, acredito que seja o teu chefe.
-Como sabe?
-Sexto sentido aguçado.
-Sim, ele é meu chefe, o cara nada no dinheiro. Quer saber o melhor? Não demonstra isso, é um cidadão muito humilde, que ajuda a todos. Tem um coração grandioso, assim como o seu. As qualidades de vocês são tão iguais...
-Sim, dona Cupido, já sei o que você quer também.
-O quê?
-Quer me entregar o número do telefone dele.
-Dessa vez você quase acertou. Ele realmente pediu para que eu fizesse isso, mas como te conheço bem, justifiquei o seguinte:
 -Vá com calma, doutor! Ela é diferente, muito diferente das mulheres que o senhor  já conheceu na vida.
-Você está me deixando confuso. O que está querendo me dizer com isso, Regina?
-Que não vou entregar o número do seu telefone porque sei que ela não vai ligar. Sei também que as mulheres se jogam para cima do senhor e, vamos concordar que todo esse dinheirão, é um forte aliado para tamanho assédio, não é mesmo?
-Você está certa! O meu dinheiro me atrapalha nas relações, quando escuto um “eu te amo” desconfio. Esta expressão aparece com muita abundância em minha vida e o amor é o sentimento mais complicado em questão de provas.
-Por estar certa, sei que ela não vai ligar. Sabe o que aconteceu recentemente? O prefeito desta cidade, pagou uma quantia relativamente alta, para descobrir apenas o número do telefone dessa moça. Depois, o próprio amigo que recebeu esse dinheirão para repassar essa informação, comentou isso com ela. Na mesma hora a danada trocou o chip do celular. O prefeito mandou inúmeros recados, prometeu viagens, casa própria, quantias altíssimas. Ela não deu a mínima. Sei que o senhor tem muito mais dinheiro que o prefeito, mas ninguém a compra. Quer mais um detalhe? Ela passa por situação financeira muito difícil. Mesmo assim, ela recusou o assédio do prefeito.
-Preciso conhecer esta mulher. Ela tem um mistério encantador, é realmente diferente das outras que conheci. Já que você está me garantindo que ela não vai me ligar, me dê o número dela, por favor.
-Quer que a coitada troque o chip do telefone novamente?
-Não! Fale apenas que eu a ligarei hoje à tarde, caso ela não queira falar comigo, respeitarei e não voltarei a ligar.
Regina deu o número do meu telefone. Depois disso, passou umas duas horas falando as qualidades do camarada para mim. Realmente, o relato me deixou curiosa, mas mesmo assim, eu tinha lá minhas dúvidas, afinal, ele era o chefe dela...
Como prometido, à tarde ele me ligou, atendi:
-Boa tarde, doutor Maciel!
-Como sabe que sou eu? Você não tem o número do meu telefone!
-Mas conheço o número de todos os meus amigos, esse telefone estranho te denunciou.
-Eu não posso negar que fiquei encantado quando te vi, mas confesso, o que mais me encantou foi o que Regina falou sobre você. É tudo verdade mesmo, ou ela está apenas querendo arrumar uma namorada para mim?
-Não sei o que ela falou sobre mim, mas deve ser verdade, nunca a peguei na mentira. E acredito que Regina não está apenas querendo arrumar uma namorada para você. Quer fazer de mim a sua namorada. Olha, talvez você pense que eu estou te dando um fora, mas não posso conversar contigo agora, estou trabalhando.
-Tudo bem! Posso te ligar à noite?
-Pode.
Nesta mesma tarde, ele me enviou três mensagens e à noite cumpriu sua promessa, ligando para mim. Ele tinha um papo muito interessante, era muito inteligente e confesso que gostava de ouvir o que ele falava. Eu tinha vinte e poucos anos, ele, quarenta e tantos. Passamos um bom tempo nesse lance de ficar conversando por telefone e mensagens. Todos os dias, Regina vinha com novidades sobre ele e sempre ressaltava:
-O homem está doido por você!
-Dizem que a desgraça de um doido é outro doido na porta, né?! Vamos ver no que vai dar tanta loucura junta.
Mas ele tinha muita cautela comigo porque Regina sempre o alertava quanto ao meu modo de agir e pensar. Tinha o cuidado de me ligar com muita frequência e um dia, depois de um longo papo, foi bem imperativo:
-Preciso te conhecer pessoalmente, não aguento mais!
-Defina pra mim esse “não aguento mais”.
-Eu não posso definir. Se eu fizer isso você corre de mim.
-Veja bem, se o “não aguento mais” for um desejo avassalador de me agarrar ao me ver, esqueça. Ainda tenho você como um amigo.
-Mas eu não tenho você como amiga, nunca tive.
-É justamente aí onde mora o perigo. É melhor não me conhecer pessoalmente, poderá decepcionar-se comigo. Não responderei às suas expectativas e isso poderá te frustrar. Acho que não é o momento certo para este encontro acontecer.
-Não posso ficar conversando com você somente por telefone. Vamos combinar uma coisa? É preciso que você confie em mim, venha para minha casa. Mandarei meu motorista te buscar.
-Pra sua casa? Mas não vou mesmo!
-Eu sabia que você iria me responder isso. Não farei nada que você não queira. Do mesmo jeito que meu motorista irá te buscar, farei te levar caso eu ultrapasse qualquer barreira sua, ok?! Confie em mim, não te decepcionarei. Diga que vem, por favor.
-Tudo bem, Maciel, você me convenceu.
Algumas cidades nos separavam. O motorista foi me buscar e durante a viagem me preparou:
-Você vai gostar do doutor Maciel e nem pense que o que falo agora foi ordenado por ele. Ele é um cara bom e seu nome, moça, é mel na boca dele.
Lá chegando, tinha um churrasco me esperando. A casa dele era muito bela, me vi perdida naquela grandiosa construção. Me tratou com muita dignidade, passamos a tarde inteira no terraço, apenas conversando. A distância foi respeitada mesmo! Ele me impressionava com suas atitudes. Eu gostava dele, mas tinha certeza que o seu sentimento por mim era muito maior que o meu simples gostar. Me convidou para jantar, eu recusei. Geralmente os jantares andam de mãos dadas com o romantismo, pensei nisso e para evitar decepções, pedi que me levasse para casa.
-Durma aqui!
-Não!
-Só farei o que você permitir, já te prometi isso.
-Não, o dia foi maravilhoso ao teu lado, pode acreditar nisso, mas eu quero ir embora.
Ele dispensou o motorista e foi me levar.
       O tempo foi passando e as conversas ao telefone passaram a ser cada vez mais demoradas. Um novo convite para ir à casa dele surgiu. Eu queria ir, mas fiquei preocupada:
         -Olhe, da última vez que fui, você queria que eu dormisse aí, sei que este pedido será feito novamente e para não haver decepções, absorva de antemão que não vou dormir com você.
        -Eu já pensei nisso, moça! Já te conheço, não ficaremos a sós. Dessa vez, quero que você venha para que um casal amigo meu te conheça. Falo tanto sobre você que a curiosidade deles está me incomodando. Gostaria que vissem com os próprios olhos que não minto quando falo sobre você. Poderá vir sem medo, embora eu tenha vontade de avançar todos os teus sinais, me comportarei.
            -Sendo assim, tudo bem.
            Novamente, o motorista veio me buscar. Ele não mentiu, realmente o casal estava lá. Quando cheguei, ele estava bebendo, perguntou se eu queria, recusei. Depois de um longo papo ele sugeriu:
            -Vamos tomar um banho de mar?
            -Eu não trouxe biquíni.
            -Isto não é um problema. Compraremos um para você.
            -Não precisa. Se você quer tomar um banho de mar, eu te acompanho até à praia e fico na areia te observando, mas não vou entrar na água.
        -Menina, você é muito esperta. Sei que não é novidade, por isso falo com naturalidade: Tenho um desejo muito grande por você, minha vontade é verdadeiramente te ter em meus braços, mas continuo firme na palavra. Nada farei se você não quiser que seja feito.
            Fomos à praia, ele tomou banho de mar com o amigo dele e eu fiquei conversando com a esposa desse amigo na areia. Por diversas vezes ele sinalizou me chamando para entrar no mar, neguei todas. Quando ele saiu me perguntou:
            -Por que não entrou quando te chamei?
            -E depois eu vestiria que roupa?
         -É, realmente eu não tenho roupas femininas lá em casa, mas isso não é um problema, te compraria algumas.
            Voltamos os quatro para a casa dele. Maciel disse que me levaria para minha casa quando eu quisesse ir. A bebedeira continuou e depois veio a minha preocupação: “E agora? Ele bebeu o dia inteiro e eu não vou ter coragem de voltar para casa com ele dirigindo”. O casal amigo foi embora, e ficamos somente com dois empregados que cuidavam da casa. Eu decidi dormir lá. A notícia que eu passaria a noite por lá foi animadora. Com o anoitecer, o tempo esfriou, saímos do terraço, fomos para a sala e cada um deitou em um sofá. Ficamos a filosofar a vida. Volta e meia, ele iniciava um papo romântico e eu quebrava a linha de raciocínio dele. Quase meia-noite, acabada de cansaço, eu adormeci no sofá. Senti um leve pouso da boca dele na minha, acordei assustada.
            -Desculpa! Eu não resisti. Na verdade eu não queria te acordar, desejei apenas chegar um pouco mais perto de você. Não foi nem um beijo, foi apenas um toque, não precisa ficar brava comigo.
            -Não repita isso!
            -Tudo bem, será difícil, mas eu tentarei. Menina, sei que você está cansada, vá para a cama!
            Eu estava despreocupada quanto a isto porque eu já conhecia a casa e sabia que a mesma tinha muitos quartos. Dormiríamos em quartos separados, obviamente. Falei:
            -Estou cansada, é verdade, mas preciso de um banho antes da cama. Me dê uma toalha, por favor.
            -Claro! Quer um calção meu para dormir mais à vontade?
            -Não precisa, obrigada.
            -Vai dormir de calça jeans?
            -Estou bem, não se preocupe.
           Ele me levou para o quarto dele, ligou o ar, me deu uma toalha e disse:
            -Este é o meu quarto, aquele é o meu banheiro, é o melhor da casa, use-o!
           Tomei meu banho. Ao sair do banheiro, vi uma cena incomum que tenho certeza que vou morrer e não passarei por situação semelhante. Ele estava deitado, só de cueca, mas a cama de casal estava dividida com três enormes travesseiros.
Perguntei:
            -Pra quê isso?
            -Não é assim que você quer? Tem medo de dormir comigo, não tem? Vou te provar que sou um homem de palavra. Nada será feito caso você não queira.
            -Em uma casa que tem essa quantidade absurda de quartos, o que te faz pensar que eu vou dormir com você?
            -Vai sim!
            -De forma alguma!
            -Vai! Entenda uma coisa: este é o melhor quarto da casa e é nele que você vai dormir porque você merece o melhor. Porém, a casa é minha. Você acha justo que eu saia do meu quarto?
            -Não quero que você saia do seu quarto, eu vou sair. Não faz vinte minutos que você tentou me beijar enquanto eu dormia no sofá. Não vou passar a noite na mesma cama que você.
            -Vai!
            Trancou o quarto. Eu comecei a ficar com medo. Pensei: “Pronto! E agora? Que situação difícil! Eu e ele na mesma cama, esse camarada vai me atacar, com certeza! Sem muita alternativa, deitei. Conversamos ainda por um tempo. Falei o seguinte:
-Olha, me acorda cedo, amanhã eu tenho que trabalhar.
-Vai não, fica comigo, por favor!
-Não posso, meu salário será descontado e me fará falta.
-Eu pago pelo seu prejuízo. Fique a semana comigo, eu preciso trabalhar, mas será uma felicidade grande chegar do trabalho e te encontrar aqui.
-Enlouqueceu? Não trouxe roupa e outra coisa, não quero seu dinheiro.
-Você se preocupa com coisas tão pequenas. Amanhã podemos perfeitamente comprar roupas para você, compro o que você quiser e te darei todos os mimos que uma mulher precisa. Depois vamos ao supermercado e você escolhe o que gosta de comer. Enquanto eu estiver trabalhando, você terá o dia inteiro para ir à praia, passear, o motorista estará à sua disposição, não terá que se preocupar em fazer almoço porque tem quem faça para você. Fique comigo, te farei feliz.
-Não! Outro dia eu passo por aqui novamente, não vamos forçar situações, ok? Se eu tiver que ser sua, chegarei de uma maneira que te surpreenderá.
Acabei adormecendo com os três travesseiros entre nós. Quando acordei levei mais um susto com outra cena incomum: ele estava acordado, com o rosto muito próximo ao meu, me observando. Falei:
-Bom dia, né?
-Bom dia, garota linda!
-Você passou no teste que eu julguei mais difícil, devo confessar: julguei que você fosse me atacar durante à madrugada.
-Tive muita vontade, mas eu disse que sou um homem de palavra. Você não é capaz de imaginar o tamanho do desejo que senti. Sabe o que é ter a mulher desejada deitada na sua cama e nada poder fazer? Foi tão difícil administrar isso em mim que eu não consegui dormir.
-Sério?
-Muito sério! Passei a noite inteira só te observando, você é linda dormindo, sabia?!
-Rapaz, já me falaram isso mas eu nunca acreditei.  Nesse estado de quase morte, não devo ser nada encantadora vista assim, por este ângulo. Sim, vamos deixar de papo, que meu trabalho está gritando o meu nome.
-Não vá, por favor!
-Preciso ir.
Por mais que eu gostasse da companhia, eu sabia que não deveria ficar. Alimentaria um fogo que crescia intensamente. O fato de saber que ele passou a noite somente me observando, foi muito perturbador pra mim, porém eu também o perturbava, ele sempre falava:
-Quanto mais você me nega, mais meu desejo por você aumenta. Tenho consciência que tenho muito dinheiro e não falo isso para impressionar, mas para te conscientizar que não preciso fazer esforço algum para que uma mulher fique comigo. Na verdade, elas se jogam, fazem o que quero. Venho te cortejando já faz um bom tempo e nada! Durante todo esse período, você nunca aceitou meus presentes ou pediu dinheiro, e eu sei que você precisa. Nunca vi isso na minha vida. Você é impressionante.
-Vá se acostumando. Nem o dinheiro que eu ganho com o meu suor me encanta, quanto mais o dos outros. Não me apego ao material. Se algum dia eu namorar você, poderá ter a certeza que eu estarei verdadeiramente gostando de ti. Não penso em seu dinheiro, na verdade, nunca pensei. O que me traz até aqui é o teu caráter que é fenomenal. Gosto de estar ao seu lado.
Ele chamou o motorista e ordenou:
-Ela precisa ir embora, mas hoje eu não vou dirigindo. Estou com sono, cansado, não dormi esta noite. Mas, eu vou acompanhar vocês.
Nesse momento, senti vergonha com o que ele falou para o motorista. Os empregados sabiam que eu tinha dormido com ele, logicamente, se passava na cabeça deles que tínhamos passado a noite muito bem acordados, desfrutando de um prazer intenso. Julguei que ele havia falado isso para que o motorista tivesse realmente este tipo de conclusão. Isso me decepcionou. Ao entrarmos no carro, ele dormiu na mesma hora e eu não tinha coragem nem de olhar para a cara do motorista. Ao perceber que ele tinha acordado, falei:
-Bom dia novamente!
-Estou quebrado!
O motorista escutando esse papo e a minha decepção aumentando, com certa aspereza na voz, questionei:
-Tá quebrado por qual motivo, criatura?
-Porque não é nada fácil passar a noite na mesma cama com a mulher que se deseja e no entanto ter três travesseiros atrapalhando qualquer toque com ela. Eu disse que você só ficaria comigo se quisesse. Você não quis e isso tirou o meu sono, o que fez com que eu passasse a noite te observando. Por tal razão, estou quebrado.
Neste momento, o motorista não conseguiu disfarçar o espanto e olhou para mim pelo retrovisor. Ele ficou surpreso com a confissão e eu mais ainda. Qualquer homem na situação de Maciel, deixaria que entendessem o que quisessem e demonstraria que havia passado a noite comigo. Mas o caráter dele era formidável. Não posso jamais negar que ele me tratou por todo o tempo com muito respeito.
Me deixaram no trabalho e partiram. Dias depois eu decidi mudar de cidade e liguei pra ele:
-Maciel, eu vou me mudar, arrumei um novo emprego e não poderia sair da cidade sem comunicar isso para você.
-Quanto tempo você tem por aqui ainda?
-Uma semana.
-Vou te buscar agora!
-Não! Preciso arrumar minha mudança, lembra?
-Não se preocupe com coisa pequena, resolverei isso. A mudança só será capaz de te tirar do sério se você quiser. Caso permitia, mando agora mesmo algumas pessoas para sua casa e elas organizarão tudo. Tire esta semana para descansar, venha para minha casa.
-Poxa Maciel, você não tem jeito mesmo! Muito obrigada, mas eu prefiro me virar sozinha.
-Poderei saber qual será o seu destino?
-Claro, eu irei morar um pouco distante do meu trabalho porque na cidade que vou trabalhar, o aluguel é muito caro e não cabe no meu orçamento.
-Cabe no meu. More onde quiser, escolha a casa e me comunique. Comprarei para você.
-Não faça isso! Eu não iria gostar, pode acreditar nisso.
-Se não quer este presente meu, escolha a casa que pretende alugar, não existe aluguel caro para mim, digo isso porque não é novidade para você. Falta de dinheiro não vai ser um problema na sua vida. Pagarei tudo e além do seu salário, eu te darei mais algum dinheiro para que você possa gastar.
-Não Maciel, sinceramente muito obrigada, mas eu já disse que não quero seu dinheiro. Tenho que andar com as próprias pernas! Entenda, é tão difícil assim absorver isso? Faz um tempão que venho te repetindo a mesma coisa e você continua com suas ideias fixas.
Assim como disse Regina, eu e Maciel combinávamos muito, mas quando o assunto era dinheiro, ele queria que eu aceitasse o que eu julgava inaceitável. Eu fiz a minha mudança, pouco tempo depois foi o meu aniversário, ele me procurou, passeamos por belíssimos lugares (eu até duvidava que estivesse no Brasil, diante de tanta beleza). Mas já na hora de me deixar em casa, ele tentou me beijar contra a minha vontade. Recusei, e com muita decepção ele disse:
-Eu te desejei por todo esse tempo e você sempre negou. Um dia você vai se arrepender de tudo isso, tenho certeza. Eu vou embora, se quiser conversar comigo, passear, viajar, você sabe como me encontrar. Basta me ligar que o motorista vem te buscar. Se não quiser se dar ao trabalho, pegue um táxi, chegando em minha casa, eu pagarei a viagem.
-Maciel, eu sei que você é diferente dos homens que já conheci, mas entenda que eu também sou diferente das mulheres que você teve diante dos olhos. Não abusei da sua boa vontade, nem tampouco do seu dinheiro. Gosto de você, mas não ao ponto de me envolver em um relacionamento amoroso, não ainda. Mas a proposta está no ar, você disse que eu vou me arrepender, caso isso aconteça, te procurarei.
-Eu faria de você a mulher mais feliz dessa vida, sou capaz disso, não pelo fato de ter muito dinheiro, ele não compra tudo como dizem por aí. Você é a prova deste ditado popular, meu dinheiro nunca te comprou. Eu não deixaria o sorriso sair do teu rosto porque o que sinto por você é intraduzível e durante todos os meus anos, te procurei sem saber que de fato você existia.  É extremamente forte o que sinto, mas não consigo mais te olhar sem nem ao menos poder te beijar. Tudo tem limite, cheguei ao meu. O meu desejo é muito grande para controlar, não aguento mais palavras distantes, passeios intocáveis, sentimentos não consumados. Eu quero você e aguardo o dia que me queira.
Me deu um forte abraço e foi embora. Senti uma grande surra da vida naquele momento. Eu fiquei muito confusa, sabia que Maciel estava certo, eu não discordava dele nem por um milésimo de segundo. Ele sentia que eu não queria, então a distância seria mesmo o melhor recurso pois dessa maneira, ele poderia me esquecer.
O tempo passou e me respondeu que Maciel estava certo. Eu entendi que achar outro homem que me respeitasse como ele era como achar a famosa agulha no palheiro. A distância e o silêncio provaram para mim que eu o amava. Na verdade, esse sentimento sempre existiu em mim, desde quando apenas conversávamos ao telefone, mas ele me assustava. A quantidade absurda de dinheiro e bens que Maciel tinha era algo assombroso. Eu sempre me julgava impotente e desprovida das provas que ele me dizia que esperava de outras mulheres que já havia se relacionado.
O meu “te amo” ele nunca ouviu, embora eu o tenha amado. Ele estava certo quando dizia que o dinheiro atrapalhava seus relacionamentos, esta foi a principal razão que me separou dele: sua riqueza material. Tinha uma questão que não saía da minha cabeça, ao me colocar no lugar dele, eu imaginava que muito justo seria se este tipo de julgamento viesse da parte dele: “Ela é jovem, muito mais nova que eu, está comigo apenas pelo meu dinheiro”. Essa possibilidade eu não conseguia descartar e cada vez que ele tentava se aproximar, eu recusava. Acreditava piamente que caso permitisse o romance, sofreria com questionamentos infindáveis relativos ao meu amor por Maciel, na época, simplesmente abri mão.
Peguei o telefone por diversas vezes, mas fui incapaz de ligá-lo. Resolvi deixar o passado no passado. Não tive mais notícias dele, mas uma coisa é certa: realmente ele me faria feliz, essa certeza carrego em mim porque conheci profundamente o caráter fora do normal, carinho, atenção e respeito que Maciel sempre me proporcionou. Sem relacionamento firmado, nem ao menos um beijo dado, ele provou que durante todo o tempo foi o homem que sempre procurei na vida. Esse presente que o dinheiro dele não era capaz de comprar, ele me deu.  Dou a mão à palmatória e confesso: Maciel era diferente, o considero a exceção da regra masculina e concordo que estava coberto de razão, eu me arrependi e até hoje, espero encontrar a falha do ditado popular: Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar.

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